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James Webb promete mostrar estrelas e galáxias com resolução sem precedentes

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Foto: NASA/STScl/CEERS/TACC/ S. Finkelstein/ M. Bagley/ Z. Levay

Recorte de mosaico com registros individuais capturados pela Near Infrared Camera (NIRCam) do JWST. A imagem original consiste em uma montagem com 690 quadros. Segundo os cientistas do CEERS, foi o maior registro fotográfico já obtido no campo da pesquisa de galáxias.

A expectativa é que cenários de há muito tempo, em galáxias muito, muito distantes, comecem a se revelar. Não se esperam observações do “Planeta Tatooine”, nem da “Estrela da Morte” ou de alguma frota estelar. O que os cientistas aguardam são dados que impulsionarão pesquisas em diversas áreas da astronomia. Dentre os campos em estudo, galáxias e populações estelares devem atrair a atenção pelo impacto, além da beleza das imagens, de dados que podem redefinir nossa compreensão da formação do universo.

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Foto: NASA, ESA, CSA e STScI
Quinteto de Stephan. Alvo do estudo de formação estelar e de interações entre galáxias.

Um dos fatos científicos que mais tem atraído a atenção nos últimos meses é a entrada em operação do James Webb Space Telescope (JWST). Fruto de um projeto colaborativo entre a norte-americana Administração Nacional Aeronáutica e Espacial (NASA), Agência Espacial Europeia (ESA) e Agência Espacial Canadense (CSA), o aparato que orbita a Terra passou do período de testes e calibragem e começou a gerar as primeiras imagens no início do segundo semestre de 2022.

O novo observatório custou cerca de US$ 10 bilhões e baseia-se na detecção de raios infravermelhos, que permitem a análise de propriedades físicas como temperatura, massa e composição química de um objeto astronômico. Câmeras e espectrômetros do telescópio espacial possuem detectores capazes de registrar sinais extremamente fracos, dentre eles um instrumento que registra até 100 objetos simultaneamente.

As pesquisas iniciais com o JWST dividem-se em vários ramos: exoplanetas e discos protoplanetários, meios intergaláctico e circumgaláctico, estrutura e escala do universo, sistema solar, física estelar e tipos estelares, buracos negros supermassivos e núcleos galácticos ativos.

Duas categorias devem chamar a atenção pelas potenciais respostas e beleza das imagens: galáxias e populações estelares. O professor Pieter Willem Westera explica que, para compreender as próximas contribuições do JWST nesse ramo de pesquisa, torna-se indispensável ter uma base de astronomia fundamental.

Populações estelares e galáxias

O uso do termo “população” para o estudo de estrelas surgiu com o astrônomo e astrofísico alemão Walter Baade, em 1944. Mais tarde, outros cientistas usaram essa definição para conjuntos de estrelas com história em comum. Também a empregaram para aglomerado estelar – como população estelar simples (cujas estrelas formaram-se juntas) –, e para galáxia – como população mais complexa.

Baade distinguiu as populações entre I e II, sendo a primeira formada por estrelas como as que se encontram na vizinhança solar (incluindo o próprio Sol) e no resto do disco da Via Láctea (e de outras galáxias similares). Posteriormente, descobriu-se que tais astros têm uma alta fração da sua massa (cerca de 2%) em elementos mais pesados que o hélio – o que os astrônomos chamam de “metalicidade alta”.

Westera conta que as demais estrelas que formam a população II encontram-se no halo da galáxia (região nos arredores do disco galáctico) e têm metalicidade mais baixa, isto é, contêm cerca de dez vezes menos elementos pesados que as da população I – em geral, as da população II são mais velhas que as da população I.

Professor Pieter Westera: mais um passo na trajetória do nosso entendimento de como o universo se formou.
Foto: José Luiz de Godoyfoto pag15 inf

O professor esclarece que a origem da diferença entre os tipos I e II pode ser compreendida por um modelo extremamente simplificado da formação da Via Láctea (Eggen, Lynden-Bell e Sandage, 1962), pelo qual uma gigantesca nuvem de gás começou a se contrair pela gravitação. Durante esse processo, as estrelas de baixa metalicidade da população II formaram-se no halo, e em seu interior a fusão nuclear formou mais elementos pesados. “Pela morte de estrelas de curta vida e por ventos solares, parte desses elementos foram devolvidos ao gás interestelar, provocando aumento da metalicidade” – conta Westera.

No final da contração, o gás acumulou-se em formato de disco, em virtude do momento angular que possuía. Foi nesse disco de gás enriquecido por elementos mais pesados que surgiram as estrelas da população I – o que explica o fato das que se encontram no disco da galáxia serem mais jovens do que as situadas no halo. Parte do gás que sustentou esse processo sobrevive, atualmente, na forma do disco de gás e poeira da Via Láctea, dentro do qual continua a ocorrer um pouco de formação estelar até hoje. “Isso é típico nas regiões que se estendem como braços espirais conectados a um disco, como boa parte das pessoas já deve ter observado em lindas imagens de galáxias espiraladas” – lembra o professor.

Outros formatos

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Foto: NASA, ESA, CSA, STScI, Webb ERO Production Team
Milhares de estrelas jovens massivas, em azul claro, puderam
ser vistas na Nebulosa da Tarântula.

Nem todas as galáxias têm discos como a Via Láctea. Muitas apresentam formas elipsoidais, chamadas, portanto, de elípticas. Segundo Westera, o modelo simplificado explica a sua existência pela seguinte circunstância: após a formação das primeiras estrelas, não sobrou gás para formar o disco, ou seja, galáxias elípticas são, basicamente, apenas halos estelares. “De fato, nas elípticas encontram-se, principalmente, estrelas velhas de baixa metalicidade – as da população II – e quase nenhum gás” – explica o professor.

Esse modelo extremamente simplificado, no entanto, não explica todos os tipos de galáxias que observamos. Existem as irregulares, as muito pequenas, as com alta taxa de formação estelar atual e as elípticas gigantes, que, ao contrário das elípticas “normais”, contêm estrelas ricas em metais e gás. É necessária uma abordagem mais sofisticada, que inclui interações e fusões de galáxias, para se conseguir estudar a formação desses outros tipos de galáxias.

Westera afirma que o modelo de formação estelar e galáctica tem um problema: cálculos das condições do universo primordial (período logo após o bigue-bangue) e observações de gás intergaláctico mostram que o material disponível naquele momento, supostamente a fonte para tudo o que foi feito, não continha “NADA” de elementos mais pesados que o hélio, ou seja, havia metalicidade zero.

Surge a questão: de onde vieram os elementos mais pesados, que detectamos hoje até nas mais antigas estrelas observáveis (as da população II)? Presumivelmente, teriam sido formados em estrelas que, inicialmente, tinham metalicidade zero. De acordo com o professor, astrônomos chamam essas estrelas hipotéticas de população III. “Os modelos de formação estelar preveem que as estrelas da população III teriam propriedades bem diferentes das contemporâneas (das populações I e II); um exemplo de distinção seriam as massas mais altas” – avalia Westera.

Mais além

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Foto: NASA, ESA, CSA, STScI
O sistema de infravermelho do JWST revelou dezenas de
estrelas recém-formadas entre colunas de gás e poeira nos
Pilares da Criação.

Até os dias atuais, essa primeira geração de estrelas (população III) e de galáxias ainda não foi observada, em virtude de que teriam existido em um passado muito distante, quando o universo tinha menos de um décimo da idade atual. Na astronomia, para ver o passado é preciso “olhar na distância”, isto é, para se alcançar as primeiras estrelas e galáxias temos de enxergar mais longe do que foi possível até hoje.

Aqui, o James Webb entra na história com sua estrutura para “ver” na faixa infravermelha – justamente o pedaço do espectro em que as primeiras estrelas e galáxias devem se revelar. A NASA espera obter observações com sensibilidade e resolução espacial e espectral sem precedentes. “Se a estimativa da agência americana se confirmar, nos próximos anos teremos dados de estrelas da população III e das primeiras galáxias” – exalta o professor.

No caso das estrelas, por meio dos espectros será possível determinar grandezas como temperaturas, composição química (têm mesmo metalicidade zero?) e massas (são mesmo mais pesadas que as nossas estrelas vizinhas?). No caso das galáxias primordiais, a expectativa é a possibilidade de se elaborar mapas de conteúdo estelar, de gás e demais propriedades.

Segundo Westera, essas informações ajudarão a confirmar (ou refutar), melhorar e refinar os atuais modelos de formação e evolução do cosmos. “Daremos mais um passo na trajetória do nosso entendimento de como o universo se formou, como o conhecemos hoje, com sua enorme variedade de galáxias, estrelas e outros objetos.” Que a força esteja com o James Webb!


Esta matéria é parte da Edição número 01, da Revista Comunicare UFABC.

Assessoria de Comunicação e Imprensa - ACI UFABC

Registrado em: Edição nº 1 - 2023
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