Maior incidência de eventos climáticos extremos eleva a importância da gestão do espaço urbano
No Brasil, aproximadamente 85% dos desastres ambientais estão relacionados à chuva ou à falta dela. Na Região Metropolitana de São Paulo, 2,1 milhões de pessoas vivem em condições precárias de moradia, muitas delas sob riscos relacionados à má gestão das águas urbanas. Inundações, deslizamentos de terra e secas prolongadas resultaram em milhares de mortes nas últimas cinco décadas e, com as evidentes consequências do aquecimento global, a incidência de eventos climáticos extremos tende a aumentar. Esses dados foram compilados em Why do extreme events still kill in the São Paulo Macro Metropolis Region? Chronicle of a death foretold in the global south, artigo da professora Luciana Travassos, da UFABC, e de outros pesquisadores da USP, com base nos períodos chuvosos de 2016 a 2019.
Os riscos associados às ameaças ambientais apresentam indicadores conectados às desigualdades sociais, o que se constata, especialmente, na divisão desarmoniosa e insegura do espaço urbano. Dentre os principais problemas Maior incidência de eventos climáticos extremos eleva a importância da gestão do espaço urbano estão incompatibilidades devidas às características do terreno, à ocupação de áreas próximas a aterros ou degradadas por mineração, à instalação em áreas de proteção ambiental, à precariedade técnico-construtiva e à insuficiência de infraestrutura de serviços públicos, como calçamento, drenagem, coleta de águas, esgoto e lixo. Para Luciana, trata-se de um reflexo de políticas públicas ineficientes e incompletas, que acabam por acarretar na vulnerabilidade socioambiental de parcelas da população. Os problemas da expansão urbana são frutos das intervenções do homem no território, que ocorrem associadas a uma grande série de inadequações em relação à natureza.
Historicamente, esse processo de urbanização desordenado e o adensamento populacional a ele inerente, somados às crises gerenciais dos municípios e à especulação imobiliária, geraram segregação espacial, degradação e insegurança ambiental. Ou seja, os riscos existem, não por culpa da natureza, mas sim por falhas de desenvolvimento, uso e ocupação do solo, além de toda a complexa dinâmica social do território, explica o professor Fernando Rocha Nogueira, coordenador do Laboratório de Gestão de Riscos (LabGRIS) da UFABC.
Imagem com a localização dos 126 setores mapeados emImagem com a localização dos 126 setores mapeados emSão Bernardo do Campo. |
Imagem de satélite com a localização de quatro setoresImagem de satélite com a localização de quatro setoresda localidade Vila São Pedro. O trabalho ocorreu em 34localidades/bairros do município. |
Imagens: LabGRis, 2021 |
Foto de drone com a delimitação de dois setores daFoto de drone com a delimitação de dois setores dalocalidade Vila São Pedro. |
Foto de drone com a indicação preliminar de obras para oFoto de drone com a indicação preliminar de obras para otratamento do risco dos dois setores indicados na foto àesquerda. |
Justiça e governança
De acordo com os estudos do LabGRIS, os efeitos das mudanças climáticas exigem novas práticas de adaptação, mesclando justiça ambiental e governança antecipatória. Com planejamento e uso da ciência é possível antecipar, analisar e criar estratégias flexíveis de adaptação, monitoramento e ação. Segundo o professor Fernando, o risco é um sinal, uma evidência da potencialidade de acontecer um desastre – e não o próprio desastre: “Risco é uma suposição, a percepção de um problema que pode gerar danos. Risco é uma abstração indispensável.”
Considerando que os riscos são passíveis de serem identificados e analisados, e são, em grande parte, previsíveis, para além do enfrentamento de desastres, a arquiteta e doutora em Ciência Ambiental afirma que diversas ações de políticas públicas e gestão são necessárias para aumentar a capacidade das cidades de lidarem com as mudanças climáticas: “A adoção de ações com base nesse princípio tem potencial para reduzir os efeitos nocivos de inundações, deslizamentos e ondas de calor, principalmente sobre as populações mais vulneráveis (maioria das vítimas dos desastres registrados no Brasil)”.
Uma agenda nacional de políticas públicas diz respeito ao mapeamento do território; elaboração de planos de ação; execução de obras para mitigação de desastres em áreas de maior fragilidade; e qualificação, organização e formalização de órgãos municipais e núcleos comunitários de proteção e defesa civil. Essa estratégia de gestão deve também considerar as crises climática, sanitária e ambiental, além de ser socialmente preocupada com os riscos a médio e longo prazos. “Minimizar os danos e evitar perdas é promover o desenvolvimento sustentável e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida de uma comunidade’’, conclui o geólogo, professor da pós-graduação em Planejamento e Gestão do Território da UFABC.
Laboratório
O LabGRIS desenvolve pesquisas em construção social do risco e metodologias para avaliação e quantificação de potenciais ocorrências, além de cartografias voltadas para a elaboração de mapas de processos e ameaças. Osestudos envolvem questões socionaturais, suscetibilidade do meio físico, aptidão à urbanização e vulnerabilidade, aplicáveis a processos de planejamento territorial e urbano e à tomada de decisões na gestão de riscos. O laboratório, inclusive, elabora projetos para referenciar osplanos municipais de redução de riscosdos municípios do Grande ABC. |
Esta matéria é parte da Edição número 01, da Revista Comunicare UFABC.
Assessoria de Comunicação e Imprensa - ACI UFABC
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