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Página inicial > Divulgação Científica > PesquisABC > Edição nº 38 - Fevereiro de 2025 > Os Saberes em Ação de Professores na Escola Básica que Aproximam Aluno e Conhecimento
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Os Saberes em Ação de Professores na Escola Básica que Aproximam Aluno e Conhecimento

01 pesquisabc 37

A Revista Eletrônica PesquisABC possui o seguinte registro ISSN: 2675-1461

a Sabrina Vieira de Almeida*, b Maisa Helena Altarugio**

a Discente do Curso Técnico em Química Integrado ao Ensino Médio da Escola Técnica Estadual Julio de Mesquita

b Docente Professora do Centro de Ciências Naturais e Humanas da Universidade Federal do ABC

 

Resumo: O modo como professores interagem com seus alunos em suas práticas cotidianas, de forma intencional ou não, pode influenciar na aproximação ou no afastamento dos alunos em relação ao conhecimento e afetar os resultados da aprendizagem. Quando os professores interagem com os alunos, eles colocam seus saberes em ação. Esse artigo tem como objetivo compreender a relação entre os saberes mobilizados pelos professores nas interações com os alunos e como isso afeta a relação dos alunos com o conhecimento. Para tal, a pesquisa de Iniciação Científica, coletou e analisou narrativas de alunos e professores em uma instituição escolar de Educação Básica, em Santo André (SP), a partir das inquietações de uma aluna do Ensino Médio. Como resultado, demonstrou-se que o campo do “saber-ser" relacionado à afetividade, e o “saber-fazer”, refletido nas metodologias de ensino dos professores, são aspectos apreciados pelos alunos e que, de alguma forma os fazem se aproximar mais do conhecimento.  Inferimos que a tomada de consciência desses resultados poderá contribuir com a otimização das interações entre os sujeitos e na obtenção de resultados mais satisfatórios no processo de ensino e aprendizagem.  

Palavras-chave: Saberes docentes, escola básica, relações interpessoais

 

Abstract: The way teachers interact with their students in their daily practices, whether intentionally or not, can influence students' approach or distance from knowledge and affect learning results. When teachers interact with students, they put their knowledge into action. The objective of this artical is to understand the relationship between the knowledge mobilized by teachers in interactions with students and how this affects students' relationship with knowledge. To this end, this Scientific Initiation research collected and analyzed narratives from students and teachers at a Basic Education school institution, in Santo André (SP), based on the concerns of a high school student. As a result, it was demonstrated that the field of “knowing how to be” related to affectivity, and “knowing how to do”, reflected in teachers' teaching methodologies, are aspects appreciated by students and that, in some way, make them get closer to more knowledge. We infer that becoming aware of these results can contribute to the optimization of interactions between subjects and in obtaining more satisfactory results in the teaching and learning process.

Keywords: Teaching knowledge, basic school, interpersonal relationships

*Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.  

**Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. ORCID ID: https://orcid.org/0000-0002-2924-8910

Introdução

Esta pesquisa nasce inspirada na experiência pessoal e na observação do cotidiano da escola básica por uma estudante do Ensino Médio, pesquisadora de Iniciação Científica do PIBIC-Ensino Médio, onde ela percebe claramente a influência dos saberes mobilizados pelos professores em suas práticas cotidianas, como fatores que promovem a aproximação ou afastamento dos alunos em relação ao conhecimento e, consequentemente, podendo afetar os resultados de aprendizagem. 

De acordo com Tardif (2010), os professores possuem características que os distinguem uns dos outros e que os tornam mais propensos a atraírem o alunado.  De forma intencional, ou não, entende-se que enquanto os professores realizam seu trabalho, o modo como interagem com o alunado, por meio de suas práticas pedagógicas cotidianas, está impregnado de saberes em ação. 

A esse respeito, Cunha (2012), por exemplo, cita que aspectos do “saber” (conteúdos de ensino, relação teoria e prática, linguagem e produção de conhecimento), do “saber-fazer” (capacidade de planejamento, métodos de ensino, objetivos, avaliação) e do “saber-ser e sentir” (prazer, entusiasmo, exigência, princípios e valores), são qualidades que se apresentam nas práticas pedagógicas de professores. 

O artigo vem atender ao nosso objetivo principal de compreender a relação entre os saberes mobilizados pelos professores nas interações com os alunos e como isso afeta a relação deles com o conhecimento. 

Os saberes e o papel do professor

De acordo com Carvalho e Gil-Perez (2001), cada professor tem os seus próprios saberes, visto que eles são formados com os anos trabalhando na área, com as reflexões sobre sua prática, em sua formação profissional, com experiências pessoais etc. Logo, entende-se que o conjunto desses saberes formam profissionais distintos, com diferentes maneiras de ensinar e que podem fazer o alunado se sentir mais próximo do conhecimento, ou não. 

Cunha (2012) apresentou resultados de entrevistas semiestruturadas com professores de diversas áreas de ensino, onde observou que, no ato de educar, eles colocam em prática certos saberes todos os dias. Organizar o ambiente, promover situações que melhor respondam às expectativas dos alunos e cuidar da linguagem para que ela seja um veículo de compreensão da mensagem são valores reconhecidos.

Porém, sabe-se que a maior parte dos esforços empreendidos pelos professores na sua tarefa de ensinar ainda estão concentrados na dimensão intelectual do processo educativo (Pennachim e Altarugio, 2015). Muitos professores não têm noção da influência que exercem na vida dos alunos, e algumas dimensões dessa influência vão muito além dos saberes que os professores necessitam para ensinar, tal como enunciamos anteriormente. A interação por meio do diálogo é fundamental para dar espaço para emergir o aluno protagonista, valorizado pelas suas experiências (Freire, 2015). Estudos de Felden (2008) e Ribeiro (2008) constataram que uma relação positiva com o professor, marcada por confiança, empatia, carinho e respeito, fomenta a aprendizagem, a autonomia e o desenvolvimento saudável dos alunos. A partir do ponto de vista dos alunos, André (2021) revela que o engajamento na forma de evitar e de resolver esses conflitos, baseados no diálogo, na negociação, na participação e na humanização dos serviços de educação, faz toda a diferença.

Levando em conta o papel social e político dos professores, Ruiz (2003) faz um estudo destacando a importância de os professores compreenderem que eles não podem agir de maneira neutra e distante das questões sociais, desvinculados da realidade, e que os alunos esperam que eles se posicionem, estejam dispostos ao diálogo, à problematização dos saberes.

Metodologia

A pesquisa, de cunho qualitativo, se baseia no uso de entrevistas narrativas (Jovchelovich e Bauer, 2002). O uso da entrevista narrativa rompe com o esquema pergunta/resposta, definido pelas entrevistas formais onde o papel do entrevistador é lançar uma questão motivadora e deixar o entrevistado fazer a sua abordagem, definindo sua orientação de raciocínio e o caminho necessário para abordar o assunto. 

O grupo pesquisado é composto por 12 alunos do 3º ano do Ensino Médio e 4 professores de diferentes áreas do conhecimento, todos voluntários de uma escola técnica, localizada no município de Santo André (SP), mediante Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. 

A entrevista narrativa se inicia com uma pergunta motivadora elaborada pelo entrevistador com a intenção de coletar episódios marcantes e considerados bem-sucedidos de sala de aula, tanto por parte dos professores como dos alunos. A pergunta motivadora no caso dos alunos e alunas, foi: “Você poderia me contar sobre um momento em aula em que você se sentiu motivado?” E no caso dos professores e professoras foi: “O/A Sr(a) poderia me contar sobre um momento em aula em que foi possível perceber que os alunos estavam motivados?” As respostas foram registradas em áudio e transcritas.  

A análise das narrativas se sucedeu de acordo com a “análise estruturalista” (Jovchelovich e Bauer, 2002), separando os elementos das narrativas dos professores e dos alunos, e extraindo e categorizando os saberes que entram em ação nas suas práticas educativas a partir da perspectiva de Cunha (2012). 

Resultados e discussão

Não estamos preocupados, em nossa pesquisa, em encontrar o professor ideal, nem as práticas ideais, mas identificar dentro da prática cotidiana e real, as boas práticas que aproximam os alunos do conhecimento. Baseado em nossas análises, ficou claro que não basta aos professores saber o conteúdo a ser ensinado, pois são muitos os fatores que interferem na prática cotidiana dos nossos professores. 

As narrativas dos professores demonstram que eles mobilizam diversos conhecimentos que dizem respeito ao “saber”, “saber ser” e “saber fazer” (Cunha, 2012). Compilamos na Tabela 1 os saberes assim categorizados para os 4 professores. 

Tabela 1. Categorização dos saberes dos professores  

Saber

Saber-fazer

Saber-ser

De 15 a 25 anos no magistério; possuem experiências com diversas formas de ensino; possuem formação acadêmica robusta.

Propõem atividades em grupo; estimulam a criatividade, a pesquisa e a participação da turma; aproximam o conteúdo da realidade do/a estudante.

Sentem-se livres para trabalharem como acharem adequado; possuem mente aberta; têm ousadia; são conscientes da realidade que cercam os jovens alunos.

Percebe-se que todos os professores e professoras podem ser considerados experientes em sua área de atuação. Na escola em questão, todos têm a liberdade de propor atividades e aulas práticas que fogem do ensino tradicional, ou seja, são livres para exercerem suas práticas educativas como acharem melhor. Nas entrevistas, todos apresentaram saberes trazidos de sua formação acadêmica quanto saberes adquiridos de suas experiências como professores (Tardif, 2010). 

A formação acadêmica dos professores é bastante uniforme e implica num grande volume de conhecimentos adquiridos. De acordo com os alunos, esses saberes não são os que despertam a atenção dos alunos ou que os motivam a se aproximar do conhecimento. O que diferencia e caracteriza melhor cada um deles são, de fato, outros saberes que eles mobilizam com as turmas.

Encontramos algumas ações em comum no saber-fazer desses professores, como por exemplo, todos permitem que os alunos trabalhem em grupos. Destacamos ainda o respeito ao estímulo à criatividade e participação dos alunos; o incentivo à pesquisa e a aproximação dos conteúdos à realidade cotidiana dos alunos. Este último saber-fazer aparece como o mais valorizado pelos alunos.

Dentro do escopo do saber-ser, destacamos nos relatos certas atitudes dos professores em relação aos alunos, como por exemplo, a mente aberta; a ousadia; a atenção aos sentimentos, à realidade e às opiniões dos alunos, além da postura flexível dos professores. Todas essas atitudes, de uma forma ou outra, foram muito valorizadas pelos alunos. 

Foi perceptível nas narrativas, que os 12 alunos e alunas se sentem mais motivados nos seguintes casos: quando têm uma relação positiva com o professor (um “saber ser”) e quando o professor relaciona a matéria ao cotidiano (um saber-fazer). Para ilustrar, a relação construída entre alunos e os professores, que revela o saber-ser, apareceram expressões como: “respeito mútuo”; “o professor me acolheu”; “foi paciente”; “se preocupa”; “não impõem medo”; “pensa no aluno”. O saber-fazer do professor aparece em episódios destacados pelos alunos, por exemplo, “uma coisa de química que dá pra fazer em casa”; “era um filme não tão relacionado à matéria que fazia você pensar mais sobre o assunto”. Alguns comentários sobre os conhecimentos dos professores “sabe vários assuntos” e “conhece bem a matéria que dá aula”, surgiram, mas sem aprofundamento.

De forma geral, não foram muitos os alunos que destacaram o próprio “saber” em si dos professores e professoras, como compilado na Tabela 2 a seguir: 

Tabela 2. Categorização dos saberes dos professores (segundo os alunos)

Saber

Saber-fazer

Saber-ser

Sabem vários assuntos; estão sempre atualizados; conhecem bem a matéria que ministram.

Realizam esforços para relacionar o conteúdo ao cotidiano; ajudam os alunos a aplicarem o que foi aprendido por meio de exercícios, aulas práticas e trabalhos.

Relação professor-aluno positiva; dão  liberdade aos alunos; percebem e valorizam o potencial dos alunos.

Considerações finais 

Nota-se que o campo do saber-ser, relacionado à afetividade, e o saber-fazer, refletido nas metodologias de ensino dos professores, são aspectos apreciados pelos alunos e que, de alguma forma os fazem se aproximar mais do conhecimento. Por vezes, esses conhecimentos extrapolam os conteúdos curriculares, facilitando e dando mais sentido ao aprendizado. Ao somar esses resultados ao fato de que é atribuído pouco valor às dimensões relacionais e afetivas entre docentes e discentes, torna-se claro a necessidade de informar os professores, tanto os que estão em formação, quanto os já formados, sobre o impacto que uma relação professor-aluno positiva tem. Embora o estudo esteja limitado a uma pequena amostra de sujeitos, existe potencial para outros aprofundamentos, podendo trazer contribuições para a otimização das interações entre alunos e professores e para obtenção de resultados mais satisfatórios no processo de ensino e aprendizagem.

Referências

André, E.B. O que dizem os alunos sobre os conflitos decorrentes de sua relação com os professores. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 47, e231789 (2021). https://doi.org/10.1590/S1678-4634202147231789 

Carvalho, A. M. & Gil-Pérez, D. O saber e o saber fazer do professor. In: Castro, A.D. & Carvalho, A. M. P. (Org.). Ensinar a ensinar: didática para a escola fundamental e média. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, p. 107-124 (2001).

Cunha, M. I. O bom professor e sua prática. 24. ed. Campinas: Papirus (2012).

Freire, P. Pedagogia da Autonomia. Editora Paz & Terra, Rio de Janeiro e São Paulo (2015).

Felden, E.L. Universo escolar: o lugar da afetividade no processo de ensinar e aprender. In: Anais do 14o Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino. Porto Alegre (2008).

Jovchelovich, S. & Bauer, M. W. Entrevista Narrativa. In: Bauer M. W. & Gaskell G. (Org.). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Vozes, p. 90-113 (2002).

PENNACHIM, F. A. V.; ALTARUGIO, M. H. Psicanálise e Educação: pensando a formação docente para o século XXI. Revista Iberoamericana de Educación (Online), v. 67, n. 1, p. 27-41 (2015). https://doi.org/10.35362/rie671262

Ribeiro, M. L. A afetividade no bojo dos currículos de formação de professores. In: Anais do 14o Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, Porto Alegre, RS (2008).

Ruiz, M.J.F. O papel social do professor: uma contribuição da filosofia da educação e do pensamento freireano à formação do professor. Revista Iberoamericana de Educación (online). no 33, p. 55-70 (2003).

Tardif, M. Saberes docentes e formação profissional. 11. ed. Petrópolis: Vozes (2010).

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