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Segregação e extermínio: o eugenismo revisitado na capital de São Paulo

Publicado: Sexta, 31 de Março de 2023, 14h30

weber lopes goesWeber Lopes Góes, egresso do Programa de Pós-Graduação em Ciências Humanas e Sociais da UFABC, pesquisou, durante o doutorado, a permanência da eugenia no Brasil após 1945 e no século XXI.

Um de seus principais objetivos era demonstrar sua existência no país na atualidade, mais especificamente em São Paulo. Segundo o pesquisador, a objetivação do eugenismo contemporâneo é perceptível em mecanismos e práticas sociais, como as políticas e ações referentes a usuários de drogas, o aumento do encarceramento em massa e a letalidade das intervenções policiais na capital paulista.

De acordo com o egresso, sua pesquisa foi inédita e pioneira, em âmbito nacional, na temática da eugenia no Brasil no período pós-guerra, além de ter sido a primeira tese de doutorado defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciências Humanas e Sociais da UFABC.

Weber é historiador e, além de doutor em Ciências Humanas e Sociais pela UFABC, é mestre em Ciências Sociais pela UNESP e especialista em Ciências Sociais pelo Centro Universitário Fundação Santo André. Atualmente, é professor substituto no Instituto Federal de São Paulo.

 

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Dados | Egresso 


Nome completo 
Weber Lopes Góes 

Formação acadêmica (cursos e instituições)
∙ Doutorado em Ciências Humanas e Sociais pela Universidade Federal do ABC (UFABC) | 2021;
∙ Mestrado em Ciências Sociais pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP) | 2015;
∙ Especialização em Ciências Sociais pelo Centro Universitário Fundação Santo André (CUFSA) | 2011;
∙ Graduação em História (Bacharelado e Licenciatura) pelo Centro Universitário Fundação Santo André (CUFSA) | 2006. 

Profissão / experiência profissional 
Professor convidado do curso de pós-graduação “História da África, Educação, Cultura e Relações Internacionais” (UNIFAI). Fui docente do curso de Serviço Social da Faculdade de Mauá (FAMA) e da Faculdade Paulista de Serviço Social (FAPSS). Sou pesquisador do Centro de Estudos Periféricos (CEP) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e tenho ministrado cursos sobre a construção do racismo na sociedade brasileira para educadores, lideranças comunitárias e educadores populares, além de contribuir para a difusão do ensino da "História e Cultura Afro-Brasileira" no currículo escolar (Lei n° 10.639/03). 

Programa de pós-graduação e curso (mestrado ou doutorado) concluído na UFABC 
Doutorado em Ciências Humanas e Sociais. 

Como sua trajetória neste curso de pós-graduação na UFABC contribuiu para sua formação? 
Primeiramente, é importante destacar a importância da própria estrutura da UFABC, no âmbito material e financeiro, ou seja: pude usufruir um espaço universitário propício para os meus estudos; a qualidade do corpo docente e os cursos oferecidos nas disciplinas da pós-graduação; o financiamento para a apresentação de trabalhos em seminários nacionais e internacionais, que foi subsidiado por meio de recursos oferecidos pela Universidade, além de eu ter sido contemplado com uma bolsa de estudos (CAPES) que me garantiu o andamento e a realização da pesquisa. Por fim, ter feito o doutorado na UFABC sem dúvida possibilitou minha qualificação enquanto pesquisador e docente, considerando que cursei a disciplina "Estágio em docência" nesta Universidade.


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Dados | Tese 


Título
Segregação e extermínio: o eugenismo revisitado na capital de São Paulo (2004-2017) 

Data da defesa
30 de novembro de 2021 

Nome do orientador
Prof. Dr. Paris Yeros 

Linha de pesquisa 
Cultura, Desenvolvimento e Políticas Públicas 

Link para a tese 


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Questões | Pesquisa 


Qual o tema da sua pesquisa e por que o escolheu? 
O tema do doutorado abordou a permanência da eugenia no Brasil após 1945. O estudo se propôs a demonstrar as práticas da eugenia no Brasil a partir das ações das políticas de combate às drogas, o crescente aumento do encarceramento e as mortes decorrentes de intervenções policiais na capital de São Paulo. A escolha pelo tema era parte de uma pesquisa que se iniciou em 2009, quando procurei estudar a relação entre a ideologia do racismo e o pensamento conservador brasileiro. Dessa forma, em 2011, defendi minha pesquisa monográfica no curso de especialização em Ciências Sociais do CUFSA, onde discuti as teorias do racismo e conservadorismo a partir das ideias do diplomata Conde de Gobineau, e a receptividade de seu pensamento no Brasil. Em seguida, estudei o movimento eugenista no Brasil com enfoque no seu principal interlocutor, Renato Kehl, que resultou no mestrado em Ciências Sociais defendido na UNESP de Marília. O resultado dos estudos sobre eugenia deu-se a partir da pesquisa de doutorado, defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciências Humanas e Sociais da UFABC, onde centrei meus estudos sobre a permanência da eugenia na passagem do século XX ao XXI. 

Quais eram seus objetivos (gerais e específicos)?
Conforme indica a história da eugenia no Brasil, desde seu início e objetivo, havia a necessidade de responder às contradições sociais num capitalismo que estava se modernizando; logo, a preocupação dos eugenistas era a superação dos “problemas” da urbanidade, do sanitarismo, da saúde etc. Além disso, a ânsia estaria em forjar um “tipo” de trabalhador livre, que respondesse às demandas do capitalismo industrial que se encontrava num processo de maturação no seio da sociedade brasileira. Tais anseios podem ser considerados no contexto dos anos 30 até os anos 80 do século passado, com a ofensiva do capital. Especialmente na entrada dos anos de 1990, a eugenia passa a ser uma ferramenta não para forjar e organizar a classe trabalhadora, mas para controlar o exército industrial de reserva e estancar possíveis mobilizações da classe trabalhadora, além de varrer para o ostracismo aqueles que são concebidos como indesejáveis, anormais e supérfluos para o capital. Isto é, a eugenia preventiva e negativa, no Brasil, tem sido um antídoto para isolar, segregar e exterminar aqueles que não estão inseridos no processo produtivo – para os presídios, comunidades terapêuticas ou, ainda, como vítimas da letalidade, por meio da política de Estado de extermínio. São esses mecanismos que denominamos de objetivação do eugenismo contemporâneo e que foram o escopo desta pesquisa. 

Como foi sua realização (materiais e métodos, metodologia, corpus etc.)?
Para a realização desta pesquisa, foram utilizados métodos quantitativos e qualitativos, além de bibliografias sobre os temas abordados. No primeiro momento, foram realizadas interpretações de informações a partir do levantamento de relatórios de instituições governamentais e daquelas que atuam no âmbito das denúncias sobre as violações de direitos, além de pesquisas sobre o tema, principalmente em relação ao encarceramento, à prevenção do uso de drogas e da mortalidade de jovens negros e pobres. Sobre o encarceramento, foram analisados os dados disponíveis no Sistema Integrado de Informação (Infopen) e os exames criminológicos – instrumentais que são feitos a pedido dos juízes das varas criminais, com a finalidade de avaliar se os presos têm condições de deixar de cumprir a pena. Ainda no que diz respeito às documentações que serviram de base para essa pesquisa, podem ser citados os Relatórios de Inspeção, produzidos pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo. A elaboração do referido documento é resultado das visitas realizadas pelos defensores públicos nas penitenciárias do Estado de São Paulo. Nesses, estão contidas as condições em que os(as) presos(as) encontram-se – saúde, alimentação e tantos outros aspectos registrados. No que concerne às políticas de combate às drogas, o propósito foi revelar as práticas de efetivação da eugenia preventiva, a partir da seguinte fonte: a Lei nº 11.343, de agosto de 2006, que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas (Sisnad). Ainda no que tange à análise das políticas de combate às drogas, foi apreciado o Decreto nº 9.761, de abril de 2019, que atualizou a política nacional sobre drogas de 2006; isto é, o que está preconizado no atual decreto é a incorporação de políticas de internação involuntária àqueles que fazem uso de substâncias psicoativas. O atual decreto prevê, também, que a internação involuntária deve ser realizada a partir da atuação e consentimento da família responsável pela pessoa que faz uso de drogas, ou por meio de um servidor público da área da saúde, por meio do aval médico. Além do mais, o presente decreto reconhece as comunidades terapêuticas como opção de tratamento para os dependentes, desconsiderando os parâmetros contidos no Sistema Único de Saúde (SUS) e favorecendo a privatização das políticas terapêuticas. Por fim, foi analisado o relatório do movimento “Craco resiste”, documento que denuncia as ações “higienistas” do Município e do Estado de São Paulo contra aqueles que habitam as regiões denominadas de “cracolândia”. Com o objetivo de aprimorar a pesquisa, foram examinados três relatórios: “O perfil das comunidades terapêuticas brasileiras” (2017), produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); o “Relatório da inspeção nacional em comunidades terapêuticas”, elaborado por: Conselho Federal de Psicologia (CFP), Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e Ministério Público Federal (MPF); e, por fim, o “Dossiê: Relatório de inspeção de comunidades terapêuticas para usuárias(os) de drogas no Estado de São Paulo: mapeamento das violações de direitos humanos”, confeccionado pelo Conselho Regional de Psicologia (CRP) de São Paulo. Em relação à letalidade, a metodologia consistiu em examinar relatórios institucionais sobre o “Mapa da Violência” de 2004 a 2017. Tais documentos são confeccionados a partir das informações sobre mortalidade disponíveis no Departamento de Informação do SUS (DATA/SUS). É nesse sítio que se encontram as causas de mortalidade, sejam aquelas consideradas “naturais” ou, por exemplo, óbitos causados por arma de fogo etc. Foram analisados os dados sobre letalidade extraídos dos “boletins de ocorrência” de 2013 até 2017, disponíveis no sítio da Secretaria de Segurança Pública (SSP) do Estado de São Paulo. Essa página contém informações sobre homicídios decorrentes de intervenção policial e, ainda, podem ser extraídos conteúdos como raça/cor, cidade, delegacia, data/fato e endereço da vítima. Tais informações foram expressas por meio cartográfico, para melhor elucidar as regiões dos alvos da letalidade na capital de São Paulo. A partir dos apontamentos acima, a pesquisa abriu senda para capturar a relação entre desigualdades étnico-raciais, formas de exploração e o racismo no capitalismo atual. E mais: verificou-se que no Brasil – embora tivessem sido atravessados curtos períodos de “democracia” – ainda perduram os métodos de dominação, segregação e outros meios de exploração de classe; daí a presença da eugenia sem nome, mas que se mantém atualmente. Nesse sentido, procurou-se explicitar, nesta pesquisa, a atualidade da eugenia (preventiva e negativa) no século XXI, a partir dos aspectos elucidados acima. 

Quais foram os desafios enfrentados?
Um dos principais desafios para a realização desta pesquisa foi demonstrar as práticas da eugenia no Brasil contemporâneo, sobretudo depois dos anos de 1945, pois, considerando as pesquisas sobre o tema, não há estudos que comprovem a existência da eugenia contemporânea – em particular na área das ciências humanas. Nesse caso, procurei demonstrar a permanência da eugenia na atualidade a partir dos documentos indicados acima. 

Quais foram os principais resultados alcançados?
Um dos principais resultados foi demonstrar que a prática das desigualdades étnico-raciais ainda é uma constante no seio da sociedade brasileira. Além disso, a eugenia ainda é um dos principais aportes que nos permitem entender como o racismo à brasileira manifesta-se em nossa sociedade. Por fim, a pesquisa também revelou a truculência do Estado brasileiro no que diz respeito às práticas de higienização em locais denominados de "cracolândia", o aprofundamento do encarceramento em massa e a mortalidade de jovens negros, perpetrados pela Polícia Militar do Estado de São Paulo. Tais atrocidades só podem ocorrer, considerando esta pesquisa, por meio da efetivação da eugenia. 

Descreva, resumidamente, a importância acadêmica e social de sua pesquisa, isto é, sua contribuição para o universo científico e o cotidiano das pessoas.
Esta pesquisa foi a primeira tese de doutorado defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciências Humanas e Sociais da UFABC, e também nas Ciências Sociais em nível nacional – isto é, foi a primeira pesquisa inédita que procurou abordar as práticas eugênicas no Brasil contemporâneo, a partir das políticas de guerra às drogas, do encarceramento em massa e da letalidade decorrente de intervenção policial. Dessa forma, creio que qualquer trabalho que for realizado sobre a eugenia contemporânea terá de consultar esta pesquisa, por considerá-la pioneira nos estudos sobre a eugenia no Brasil no pós-guerra.

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