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Página inicial > Divulgação Científica > PesquisABC > Edição nº 35 - Setembro de 2023 > Morangos frescos por mais tempo: experimento científico mostra como revestimentos comestíveis podem auxiliar na conservação desses frutos
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Morangos frescos por mais tempo: experimento científico mostra como revestimentos comestíveis podem auxiliar na conservação desses frutos

Morangos são frutos avermelhados, de sabor azedo, sutilmente adocicado, cuja fração comestível contém, em média, 91% de água [1]. Sabe-se que a atividade da água (aw) dos alimentos é um fator determinante no potencial de deterioração dos mesmos, ou seja, quanto mais água presente no alimento, maior o risco de deterioração [2]. Além disso, o morango é uma fruta que estraga com muita facilidade após a colheita, principalmente devido à sua intensa atividade metabólica e à grande suscetibilidade ao ataque de organismos causadores de apodrecimento da fruta [3].

Durante o transporte e armazenamento dessas frutas, nem sempre os morangos são submetidos às condições ideais de umidade e temperatura para sua conservação. Para evitar a deterioração precoce dessas frutas, os morangos são armazenados em embalagens plásticas que diminuem as taxas de perda de água por transpiração [4]. No entanto, as embalagens não previnem completamente a deterioração da fruta [2][3][5].

Considerando essa situação cotidiana relacionada ao armazenamento e durabilidade dos morangos, a proposta deste artigo é justamente apresentar mais detalhes sobre uma forma alternativa de conservação por meio do uso de embalagens comestíveis que possuem propriedades de barreira contra contaminação por microrganismos e de conservação da aparência e da integridade estrutural do alimento [5].

Revestimentos comestíveis baseados em polissacarídeos têm sido amplamente utilizados devido à sua abundância, bom custo-benefício e excelentes propriedades de formação de películas. Resultados promissores foram observados em diversos alimentos de origem vegetal, como os próprios morangos, mangas e abacates [6]. Em relação aos morangos, a maioria dos revestimentos comestíveis já avaliados foi produzida com diferentes fontes de amido [3][6][7]. O objetivo deste texto é, portanto, apresentar a avaliação de diferentes tipos de revestimentos comestíveis na conservação de morangos.

Como organizamos este experimento?

Para responder ao objetivo proposto, foram adquiridos morangos maduros em um mercado comercial local. Os frutos foram selecionados quanto ao tamanho, cor e ausência de alterações externas visíveis a olho nu. Em seguida, os morangos selecionados foram lavados por imersão em uma solução de 1L de água destilada e 15 mL de hipoclorito de sódio durante 15 minutos. Após este período, os frutos permaneceram em repouso por 15 minutos em temperatura ambiente. Depois, todos os morangos foram secos com o auxílio de papel toalha.

Para avaliar os diferentes tipos de revestimento comestível foram feitas as seguintes soluções:

A - Amido de milho na concentração de 3% (p/v);

B - Goma xantana na concentração de 0,5% (p/v);

C - Gelatina sem sabor na concentração de 6% (p/v);

D - nenhum revestimento (grupo controle).

Todas as soluções de revestimento foram acrescidas de glicerol comestível na concentração de 1% (v/v) com a função de agente plastificante do revestimento. Os diferentes tipos de revestimentos avaliados no presente estudo foram escolhidos por serem ingredientes acessíveis, possuírem baixo custo, e apresentarem ação espessante e/ou gelificante.

As soluções A e B foram aquecidas a 70ºC durante 15 minutos, sob agitação constante. A solução C foi aquecida a 50ºC, também sob agitação constante, visando manter sua função de agente gelificante intacta. Posteriormente, as soluções foram mantidas em repouso até atingirem a temperatura de 35ºC. Após as soluções esfriarem, as amostras de morango foram submersas por 1 minuto nas soluções. Em seguida, os frutos foram suspensos no ar para remoção do excesso da solução de revestimento, durante 10 minutos.

Por fim, cada morango foi alocado individualmente em um recipiente de vidro, fechado com o auxílio de papel filme e mantido na geladeira por 14 dias com temperatura entre 1ºC e 4ºC. Todos os grupos experimentais foram compostos por 6 morangos cada, inclusive o grupo controle, totalizando 24 morangos. Os morangos foram divididos homogeneamente entre os grupos, considerando o tamanho, cor e ausência de alterações externas visíveis a olho nu. Todos os 24 morangos foram avaliados visualmente e fotografados todos os dias durante 14 dias consecutivos. Além disso, foi feita uma análise sensorial, olfativa e, por fim, uma avaliação interna do fruto.

Para a análise sensorial, os morangos foram pressionados levemente por 3 integrantes do grupo. Com essa avaliação, buscou-se verificar possíveis alterações de textura dos morangos ao longo do tempo. A análise olfativa também foi realizada por 3 membros do grupo para tentar identificar possíveis odores relacionados ao estado de decomposição dos frutos. Já a avaliação interna das amostras foi realizada apenas no último dia do experimento para verificar a condição interna dos morangos. Após esse procedimento, cada amostra foi avaliada e classificada em 3 categorias:

Totalmente Saudáveis - amostras que não continham nenhuma deterioração e que poderiam ser consumidas;

Parcialmente Deteriorados - amostras que continham pelo menos uma região com pouca deterioração, porém, se retirada, o fruto poderia ser considerado bom para o consumo;

Totalmente Deteriorados - amostras completamente estragadas, sem possibilidade de serem consideradas para consumo humano.

Quais foram os resultados e conclusões?

Os resultados da avaliação visual mostraram que os morangos sem revestimento (grupo controle; D) foram os primeiros a apresentar sinais de deterioração. Após 5 dias de armazenamento na geladeira, duas amostras deste grupo já mostravam sinais de deterioração (Figura 1 A e B) e, ao final do experimento, todos os morangos desse grupo estavam estragados. Com relação ao grupo de morangos revestidos com solução de gelatina (solução C), uma amostra começou a apresentar sinais de deterioração após 7 dias de armazenamento na geladeira (Figura 1 C) e no final das duas semanas de experimento, todos estavam visivelmente impróprios para o consumo humano.

morangos frescos3
Figura 1. Amostras de morangos submetidos ao estudo de avaliação de diferentes tipos de revestimentos comestíveis. A) Amostra de morango sem revestimento (grupo controle) após 5 dias de armazenamento em geladeira. B) Amostra de morango sem revestimento (grupo controle) após 5 dias de armazenamento em geladeira. C) Amostra de morango revestido com solução de gelatina (Tratamento C) após 7 dias de armazenamento em geladeira. Em todas as imagens é possível observar sinais de deterioração. Fotografia dos autores.

Já os morangos revestidos com amido de milho ou goma xantana (tratamentos A e B, respectivamente) foram os que apresentaram os melhores resultados. Os frutos dos grupos A e B não apresentaram nenhuma alteração visual de apodrecimento até o 12º dia de observação (Figura 2). O mesmo foi observado com os frutos revestidos com gelatina, representando um aumento de 140% da vida útil do morango quando comparado ao resultado do grupo controle (tratamento D). O tratamento C apresentou aumento de 40%, inferior aos tratamentos citados anteriormente. A longevidade dos morangos foi calculada dividindo a quantidade de dias sem a presença de qualquer deterioração visível em cada grupo experimental (grupos A, B ou C) pela quantidade de dias que os morangos do grupo de controle (grupo D) começaram a apresentar sinais de apodrecimento. No último dia de experimento (14º dia), todas as amostras foram avaliadas pelo tato, olfato e avaliação interna dos frutos. Os resultados destas análises estão descritos no Quadro 1.

morangos frescos2
Figura 2 - Amostras de morangos submetidos ao estudo de avaliação de diferentes tipos de revestimentos comestíveis. A) Amostras de morangos revestidos com solução de amido de milho (Tratamento A) após 12 dias de armazenamento em geladeira. B) Amostra de morango revestidos com goma xantana (Tratamento B) após 12 dias de armazenamento em geladeira. Em todas as imagens é possível observar que os morangos não apresentam sinais de deterioração. Fotografia dos autores.

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Quadro 1 - Classificação dos morangos dos grupos experimentais de acordo com o tipo de revestimento comestível utilizado (amido de milho, goma xantana, ou gelatina) e do grupo controle (sem revestimento comestível) após as avaliações sensorial, olfativa e interna aos 14 dias de armazenamento em geladeira. Fonte: Elaborado pelos autores.

A conservação após a colheita do morango depende, entre outros fatores, da taxa de respiração dos frutos, que é a capacidade do fruto de gerar gás carbônico (CO2). Quanto menor a taxa de respiração, maior o tempo de conservação in natura [6]. A taxa de respiração do morango inicialmente é considerada alta, pois o morango emite a cada quilograma a 5ºC uma média de 10 a 20 mg de (CO2) [10].

Quando o morango é recoberto por uma camada de amido de milho, a amilose presente neste produto tem a capacidade de formar géis e filmes que oferecem proteção ao fruto, tendo sua resistência potencializada pela adição do ingrediente plastificante utilizado (glicerol). Em solução, as moléculas de amilose favorecem a formação de géis opacos e filmes resistentes capazes de diminuir a taxa de respiração (principalmente a transpiração) do alimento [7].

A goma xantana é um polissacarídeo produzido por espécies de bactérias do gênero Xanthomonas. Este aditivo alimentar é um agente espessante eficaz, assim como um estabilizante, capaz de se manter firme e resistente ao ser misturado com o glicerol. A solução de goma xantana, assim como o amido de milho, também produz um revestimento capaz de diminuir a taxa de transpiração da fruta [8].

Em contrapartida, a gelatina comestível, disponível comercialmente, possui em sua composição 84% a 90% de proteína; 2% a 4% de sais minerais; e 8% a 12% de água. A gelatina não contém carboidratos, gorduras, colesterol ou purina e é livre de qualquer tipo de conservantes. Essas características diferem dos demais biofilmes testados no presente estudo, já que apresentam uma alta composição de carboidratos (cerca de 90% na goma xantana e no amido de milho) e uma participação irrelevante de proteínas.

Sendo assim, é possível que a alta concentração de proteínas e a menor concentração de carboidratos tenham tornado o biofilme à base de gelatina mais perecível. Neste sentido, o biofilme de gelatina foi o menos eficiente em reduzir a taxa de respiração dos morangos, culminando com a deterioração mais precoce dos frutos, quando comparado com os revestimentos à base de goma xantana ou amido de milho [9].

O experimento aqui relatado indica que os revestimentos comestíveis à base de amido de milho e goma xantana foram capazes de manter os morangos próprios para o consumo humano por pelo menos 12 dias na geladeira. Sem esse tipo de tratamento, os morangos começaram a deteriorar a partir do 6º dia de armazenamento.

Referências

[1] DEPARTAMENTO DE INFORMÁTICA EM SAÚDE EPM. Universidade Federal de São Paulo. Relatório completo: Morango, cru. Disponível em: https://encr.pw/H3l7n. Acesso em: 19 mar. 2023.

[2] PINTO, Uelinton M.; LANDGRA, Mariza; FRANCO, Bernadette D.G.M. DETERIORAÇÃO MICROBIANA DOS ALIMENTOS.Disponível em: https://encr.pw/1JT6q. Acesso em: 02 abr. 2023.

[3] ALVES, Aline Inácio; SARAIVA, Sérgio Henriques; LUCIA, Suzana Maria Della;TEIXEIRA, Luciano José Quintão;JUNQUEIRA, Mateus da Silva. QUALIDADE DE MORANGOS ENVOLVIDOS COM REVESTIMENTO COMESTÍVEL ANTIMICROBIANO À BASE DE DIFERENTES FONTES DE AMIDO. Disponível em: https://encr.pw/bqcfx. Acesso em: 02 abr. 2023.

[4] AZAM, M. et al. Postharvest Quality Management of Strawberries. In: KHAN, M.; QADRI, R. (Orgs.). Strawberry - Pre- and PostHarvest Management Techniques for Higher Fruit Quality. IntechOpen, 2019. Disponível em: https:// doi.org/10.5772/intechopen.82341. Acesso em: 13 abr. 2023.

[5] DE AZEREDO, Henriette Monteiro Cordeiro. FARIA, José de Assis Fonseca; DE AZEREDO, Alberto Monteiro Cordeiro. Embalagens ativas para alimentos. Disponível em: https://encr.pw/ JTMAq. Acesso em: 02 abr. 2023.

[6] BARBOZA, Henriqueta Talita Guimarães ; SOARES, Antonio Gomes ; FERREIRA, José Carlos Sá ; FREITAS-SILVA, Otniel . Filmes e revestimentos comestíveis: conceito, aplicação e uso na pós-colheita de frutas, legumes e vegetais. Disponível em: https://l1nq.com/pOwhA. Acesso em: 02 abr. 2023.

[7] PEREIRA, Eloane; LOIOLA, Samy Stevans Nery; SILVA, Sabrina Neves da. DESENVOLVIMENTO DE FILMES BIODEGRADÁVEIS DE AMIDO DE MILHO. Disponível em: https://encr.pw/IcOSB. Acesso em: 14 mar. 2023.

[8] PIZATO, Sandriane. Efeito da aplicação de diferentes revestimentos comestíveis na conservação de maçãs ‘Royal Gala’ minimamente processadas. Disponível em https://encr.pw/S9jhk. Acesso em: 12 abr. 2023.

[9] FOOD INGREDIENTS, Revista. A gelatina e seus benefícios para a saúde humana. Disponível em: https://encr.pw/Ru3IV. Acesso em: 12 abr. 2023

[10] KADER, A.A. Postharvest technology of horticultural crops. 2. ed. Oakland Ca: University of California, 1992. Disponível em: https:// encurtador.com.br/qzAKL. Acesso em: 12 abr. 2023

Autoras

Renata Simões
Professora Doutora vinculada ao Centro de Ciências Naturais e Humanas (CCNH) da Universidade Federal do ABC
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Luiza Moreira Salgado
Pesquisadora colaboradora e discente no Bacharelado em Ciência e Tecnologia pela Universidade Federal do ABC
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Autores 

Antonio B. C. Siqueira
Pesquisador colaborador e discente no Bacharelado em Ciência e Tecnologia pela Universidade Federal do ABC
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João Hugo Martins da Luz
Pesquisador colaborador e discente no Bacharelado em Ciência e Tecnologia pela Universidade Federal do ABC
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Matheus Assis Gussiardi
Pesquisador colaborador e discente no Bacharelado em Ciência e Tecnologia pela Universidade Federal do ABC
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Matheus Alefe Munari Zanardi
Pesquisador colaborador e discente no Bacharelado em Ciência e Tecnologia pela Universidade Federal do ABC
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Matheus Ian Machado Furtado do Prado
Pesquisador colaborador e discente no Bacharelado em Ciência e Tecnologia pela Universidade Federal do ABC
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Registrado em: Edição nº 35 - Setembro de 2023
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