Per(cursos) de pesquisadoras na formação docente: possibilidades e desafios para a transformação institucional em educação e tecnologias
Per(cursos) de pesquisadoras na formação docente com tecnologias
O presente artigo tem como antecedentes as experiências de colaboração entre as pesquisadoras autoras, no campo da educação mediada por tecnologias. Seus interesses em comum se cruzaram quando da organização da formação Planejamento de Cursos Virtuais (PCV), oferecida em 2020, no contexto da preparação de docentes para o Ensino Continuado Emergencial (ECE), realizada na Universidade Federal do ABC (UFABC). Dessa primeira colaboração resultaram parcerias em atividades de extensão e de pesquisa que perduram, a despeito do deslocamento institucional entre elas e sua rede nacional e internacional de colaboradores.
Assim, nas seções a seguir, são apresentadas ações coordenadas pelas pesquisadoras, tais como cursos de formação, oficinas e eventos, que culminaram na aprovação do projeto de pesquisa internacional Erasmus Capacity Building Higher Education “EMBRACE - Education Modernization Brazil, Colombia, Europe - the new era of digital higher education cooperation, com vigência de 2023 a 2026, e do qual participam, além da UFABC, outras Instituições de Ensino Superior (IES) do Brasil, da Finlândia, de Portugal e da Colômbia.
O intuito é descrever, nesta edição especial dedicada às investigações conduzidas por mulheres, os antecedentes e os desdobramentos de interações em rede, que permitiram a conexão entre diferentes Instituições de Ensino Superior (IES) interessadas em fomentar transformações na academia e no mundo do trabalho do século XXI, por meio da pesquisa pautada em educação com novas tecnologias.
Cursos
Novas Tecnologias e Metodologias para Educação (NTME) foi uma iniciativa de formação docente do Núcleo de Tecnologias Educacionais (NTE), atual Núcleo Educacional de Tecnologias e Línguas (NETEL), da Universidade Federal do ABC (UFABC), que tinha como objetivo promover o uso de tecnologias e metodologias inovadoras no ensino, principalmente para os docentes da UFABC interessados em oferecer disciplinas na modalidade a distância. O curso foi ofertado na modalidade semipresencial e, a cada oportunidade, o conteúdo, as atividades e as estratégias didáticas passavam por reformulações com base nas avaliações dos participantes e experiências da própria equipe. Gradativamente, o NTME passou a ser um curso de caráter extensionista, contemplando outras pessoas interessadas e integrando participantes de todos os níveis de ensino, inclusive da Educação Infantil. O envolvimento das pesquisadoras nessa ação contemplou desde a própria formação até a coordenação de várias edições do curso, resultando em subsídios importantes para a continuação do estudo, planejamento e desenvolvimento de ações futuras.
Em decorrência das muitas reformulações realizadas no NTME e da necessidade de incorporar outras perspectivas sobre a integração das tecnologias no processo de ensino-aprendizagem, um novo formato de curso foi elaborado. Denominado Planejamento de Cursos Virtuais, o PCV foi um curso de formação docente planejado, elaborado e conduzido, em 2019, por Carla Rodriguez e Carolina Carvalho, às quais se juntou Marcella Abreu, nas edições de 2020 e 2021.
A primeira oferta ocorreu no início de 2019, no formato semipresencial, para um público majoritariamente extensionista, interessado em ampliar seus conhecimentos e desenvolver competências para planejar e desenvolver cursos e/ou disciplinas integrando as tecnologias digitais e os ambientes virtuais de aprendizagem em suas práticas.
As ofertas do PCV em 2020 e 2021 foram ampliadas e contemplaram mais de 400 professores/as, tendo por objetivo promover a reflexão e o debate a respeito da educação mediada por tecnologias digitais, sempre por meio do compartilhamento de conteúdos, recursos e métodos para o planejamento de cursos virtuais, bem como para a curadoria e autoria de materiais didáticos na educação online.
A edição de 2020 buscou apoiar os professores da UFABC na transição para o ensino remoto frente à pandemia de Covid-19. Foi reunida uma equipe multidisciplinar que contou com 54 pessoas (docentes, discentes de graduação e pós-graduação, técnicos administrativos e terceirizados), atuando em distintos papéis (professores, tutores, conteudistas, designers, estagiários).
Já a oferta de 2021 (Figura 1) foi adaptada para dar apoio à comunidade do entorno, contando com a participação de professores/ as da educação básica e do ensino superior. A equipe foi formada por 15 pessoas (docentes, tutores e designers). Para apoiar as atividades foram propostos webinários com convidados externos e da UFABC.
No total, participaram das duas ofertas 8 instituições de ensino a COPPE/UFRJ, IFMS, UNIRIO, UFRPE, IFES, UFRJ, CEFETMG, UniCEU Caminho do Mar, da Secretaria Municipal de Educação (SEMEC) de São Paulo, bem como 15 docentes e estudantes de pós-graduação, lotados nos três centros: CECS, CMCC e CCNH. Além das reflexões e conteúdos semanais, o curso resultou em 300 propostas de cursos virtuais diferentes, que evidenciaram a compreensão sobre fatores relevantes do design de formações nessa modalidade, construídas pelos participantes. O envolvimento das pesquisadoras nas ofertas do PCV consistiu em enfrentar os desafios de coordenar as equipes multidisciplinares, gerenciar, planejar, elaborar e mediar as ações.
Figura 1. Divulgação curso PCV 2021 Fonte: Moodle UFABC
Oficinas e eventos
Metodologias ativas (Figura 2) foi uma oficina, composta por 4 encontros, ofertada em 2018 e 2019 na modalidade presencial, no campus de Santo André da UFABC. Foram mais de 200 inscrições mas, devido à capacidade das salas, estiveram presentes 24 participantes em 2018, e 29, em 2019. Entre os participantes, havia docentes e estudantes da comunidade acadêmica da UFABC e professores de IES da região metropolitana de São Paulo. O principal objetivo da oficina foi desenvolver, na prática, habilidades para a utilização das metodologias ativas no contexto do Ensino Superior. A oficina considerou uma abordagem centrada nos participantes que, ao aprenderem sobre diferentes práticas para o ensino-aprendizagem, também puderam vivenciá-las ao longo do curso. Alguns registros e atividades estão no portfólio das ofertas dos cursos (Metodologias ativas 2018 e Metodologias ativas 2019). O envolvimento das pesquisadoras contemplou a ideação, o planejamento, a elaboração, a execução e a avaliação da ação.
O Educa UFABC (Figura 3) foi um evento realizado em 2019, no formato presencial, no campus de Santo André da UFABC, que reuniu 122 participantes. Teve caráter extensionista durante o qual a comunidade da UFABC e da região foram convidadas a refletir sobre o tema Docência no século 21. Idealizado no âmbito do projeto Classroom Lab (Classroom) e apoiado pelo NETEL, contou com oficinas prático-reflexivas que possibilitaram a experimentação e vivências de novas ferramentas educacionais, recursos e abordagens pedagógicas. Foram 8 horas de atividades práticas, ministradas por docentes, pesquisadores e profissionais da educação da UFABC e de 3 instituições (IFES, IFSP, CLQ).
Figura 2. Divulgação da oficina Metodologias Ativas 2019.
Fonte: https://express.adobe.com/ page/2a3MYoI1fTRVI/
Figura 3. Divulgação do evento Educa 2019.
Fonte: https://educaufabc.wixsite.com/educaufabc
A programação foi variada, conforme site do evento. O envolvimento das pesquisadoras Carla Rodriguez e Carolina Carvalho contemplou a ideação, o planejamento, a execução e a avaliação do Educa, gerando apontamentos sobre as necessidades de ações futuras para enfrentar os desafios da educação do século XXI.
Reunidas após a oferta do PCV 2020 e 2021, Carla Rodriguez, Carolina Carvalho e Marcella Abreu participaram da III edição do Congresso da UFABC, que aconteceu em setembro de 2021, trazendo o debate sobre o passado, presente e futuro da Universidade em comemoração aos seus 15 anos. Neste evento, as pesquisadoras propuseram uma mesa redonda online com o tema Experiências de formação docente durante a pandemia: partilhando práticas no ensino remoto (Figura 4). O objetivo foi apresentar o percurso do PCV (2020 e 2021) no contexto remoto, sob a ótica dos professores cursistas. Cinco professores de diferentes instituições (USP, Prefeitura Municipal de SP, UENP, UFABC) apresentaram suas experiências de planejamento de suas disciplinas online após a participação nas edições do curso, tornando visíveis os resultados do percurso formativo realizado. Esta ação foi transmitida online, teve 276 acessos até junho de 2023 e continua acessível no canal do youtube da UFABC.
A culminância dos (per)cursos: projeto internacional EMBRACE
O percurso trilhado nas ações ofertadas no formato de cursos, oficinas e eventos culminou na proposta de um projeto internacional chamado EMBRACE- “Education Modernization Brazil, Colombia, Europe - the new era of digital higher education cooperation” (Figura 5). O EMBRACE é um projeto aprovado no contexto da chamada ERASMUS-EDU-2022-CBHE, que tem o objetivo de apoiar projetos de cooperação internacional a partir de parcerias multilaterais entre organizações atuantes na área de educação superior, por meio de ações que possibilitam a melhoria da qualidade, a modernização e capacidade de resposta do ensino superior em países não associados ao programa Erasmus+.
Figura 4. Divulgação do evento Mesa Redonda no III Congresso UFABC 2021 Fonte: NETEL/UFABC
O EMBRACE responde às necessidades dos parceiros latino-americanos de desenvolver e implementar reformas institucionais, oferecendo um forte aporte para a transformação das IES. Nesse contexto, a educação é vista como um meio para responder aos desafios regionais e globais. O projeto é liderado pela HAMK (Finlândia), Universidade com vasta experiência e competência em ensino-aprendizagem e projetos de formação docente. O IPB (Portugal) apoia o trabalho em andamento, trazendo a sua expertise no desenvolvimento de projetos e parcerias com empresas e indústrias, possibilitando um ensino significativo e voltado às necessidades da sociedade, tanto no setor público, quanto no privado.
As Universidades brasileiras parceiras UFABC, IFES e o IFSP e as universidades colombianas UTP e Areandina buscam desenvolver interações de ensinoaprendizagem, bem como construir um ecossistema de parceria entre indústria, universidade e sociedade, por meio da educação pautada em novas tecnologias e diminuição da lacuna entre a academia e o mundo do trabalho.
Iniciado em abril de 2023, este projeto terá duração de 3 anos, tendo o seu workshop de encerramento nas instituições IFSP e UFABC, em março de 2026. Como resultado do projeto EMBRACE, espera-se consolidar IES modernas e resilientes na América Latina, com capacidade de utilizar a digitalização para criar experiências de aprendizagem inclusivas e centradas no estudante [1] (Figura 5).
O envolvimento das pesquisadoras Carla Rodriguez e Carolina Carvalho no EMBRACE vai além da participação na gestão da equipe UFABC no projeto: implica o envolvimento nas ações de planejamento, execução e avaliação dos impactos das ações desenvolvidas ao longo de todo o processo e contempla o engajamento no próprio percurso formativo para desenvolvimento de suas competências em áreas, como as da gestão educacional, que apoiam a transformação das IES e a criação de um ecossistema de aprendizagem sustentável integrando universidade, empresas e indústrias.
Figura 5: Metodologias e Atores envolvidos no Projeto EMBRACE
Fonte: Proposta EMBRACE (2022)
Perspectivas e (per)cursos futuros
Neste artigo, buscamos resgatar e descrever as experiências na formação docente que fomentaram ações anteriores e posteriores ao PCV, no formato de cursos, oficinas e eventos que resultaram em um projeto internacional que apoia a transformação das IES. O projeto EMBRACE abre oportunidades para a construção de um ecossistema de aprendizagem que possibilita à UFABC desenvolver ainda mais um dos seus importantes pilares, o ensino.
Alinhado ao projeto pedagógico, o EMBRACE promove a formação do docente no ensino superior, que deve estar atenta a necessidades de experiências educacionais significativas e centradas na formação acadêmica e profissional dos estudantes, por meio de modelos pedagógicos inovadores, com a integração das tecnologias também essenciais no mundo do trabalho do século XXI.
Consideramos que, para promover a transformação do processo de ensinoaprendizagem de uma IES, é importante a conscientização da comunidade acadêmica, o suporte institucional e o engajamento de todas as instâncias, contando com o apoio dos gestores, para a disseminação, elaboração de diretrizes e suporte constantes. Isso pode fomentar o engajamento de professores nas ações formativas de modo que os resultados impactem, nas suas próprias práticas, e as evidências sejam percebidas por todos os envolvidos (para além da sala de aula).
Nota
[1] Disponível em: https://portal3.ipb.pt/index. php/pt/gri/outros-programas-e-projectos
Acesso em: 25 jun 2023.
Autoras
Carolina Correa de Carvalho
Professora Adjunta na UFABC (CECS). Seus interesses de pesquisa são desenvolvimento contínuo do ensino e da aprendizagem, formação de professores, transformação institucional para modernização do ensino superior.
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Carla Lopes Rodriguez
Professora Adjunta na UFABC (CMCC) e pesquisadora no LIRTE. Os interesses de pesquisa estão relacionados às áreas Informática na Educação e Interação Humano-Computador.
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Marcella dos Santos Abreu
Professora Adjunta na Universidade Federal do Piauí (Centro de Ciências Humanas e Letras). Orienta pesquisas na área de Linguística Aplicada e formação de professores sob a perspectiva dos letramentos e da educação linguística crítica.
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